UIL

Relato VI - Meu nonno Pancrazio

Por Annamaria Girotto*

A mãe sempre trabalhou na fábrica de tecelagem Snia Viscosa, situada no bairro de Venaria Reale chamado Altessano, nos arredores de Turim, Região Piemonte, na Itália. A outra unidade da mesma fábrica ficava um pouco distante da nossa casa. Nesta, funcionava a fabricação de tecidos sintéticos, com a utilização de ácido sulfúrico, que exalava um cheiro fétido. A mãe, algumas vezes, me deixava com o nonno Pancrazio, que cuidava de porcos num sítio próximo à Snia Viscosa, a que cheirava mal. Lembro que para chegarmos até o local onde ele trabalhava, tínhamos de passar ao longo dessa fábrica que despejava um líquido espumoso, esverdeado,  de odor insuportável. O nonno era baixinho e tinha um bigode enorme. Eu me agarrava no bigode e ele conseguia me levantar do chão, tamanha era a sua força.

Eu gostava de observá-lo alimentando os porcos – eram restos de bolachas quebradas que as fábricas de doces descartavam. Eu escolhia as melhores para comer.

O nonno ficava em cima do estábulo, onde fazia as refeições e dormia. Lembro que aquela peça única tinha cheiro de alho e vinho. No sítio, havia uma escada de ferro presa à parede que levava ao sótão onde era armazenado o feno. Subir e descer essa escada era uma de minhas brincadeiras preferidas.

Para chegar ao sítio, tinha de suportar os odores da Snia Viscosa, mas quando chegava lá, era recompensada na escolha das gostosas bolachas quebradas. Quando criança, só se vê o lado bom das coisas.

*Annamaria Girotto é artista plástica, nasceu em Turim, Itália, e residiu em Porto Alegre até o ano 2000. Atualmente, vive em Garopaba, em Santa Catarina. O texto faz parte de uma série de artigos e relatos nos quais a autora discorre sobre passagens vividas por ela e sua família na Itália e no Brasil. E-mail ricbonas@nbimoveis.com.br